Arquivos falência - Lara Martins Advogados https://laramartinsadvogados.com.br/tag/falencia/ Escritório de advocacia especializados em demandas de alta e média complexidade. Thu, 31 Aug 2023 19:49:04 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=6.7.2 https://laramartinsadvogados.com.br/wp-content/uploads/2023/07/cropped-LM-favico2--32x32.png Arquivos falência - Lara Martins Advogados https://laramartinsadvogados.com.br/tag/falencia/ 32 32 Artigo Filipe Denki e Laura Finholdt. Estadão. Turbulência para os consumidores da 123milhas https://laramartinsadvogados.com.br/artigos/artigo-filipe-denki-e-laura-finholdt-estadao-turbulencia-para-os-consumidores-da-123milhas/ Thu, 31 Aug 2023 19:49:04 +0000 https://laramartinsadvogados.com.br/?p=7982 *Artigo escrito pelo advogado e sócio Filipe Denki e a advogada Laura Finholdt, e saiu primeiro no jornal Estadão

https://www.estadao.com.br/politica/blog-do-fausto-macedo/turbulencia-para-os-consumidores-da-123milhas/

 

Confira abaixo na íntegra:

A empresa de viagens 123 Milhas protocolou um pedido de recuperação judicial, no último dia 29 de agosto de 2023, na 1ª Vara Empresarial da Comarca de Belo Horizonte, Minas Gerais, alegando uma dívida de R$ 2,3 bilhões.

A agência de viagens online oferece a compra de passagens, hospedagens e outros serviços e produtos de viagens, como pacotes, seguros e aluguel de carros.

No entanto, a companhia havia interrompido as atividades de sua linha promocional “Promo” em 18 de agosto, afetando as viagens agendadas entre setembro e dezembro de 2023.

Essa medida foi atribuída a desafios econômicos e de mercado, incluindo a elevada demanda por voos, que manteve os preços nas alturas mesmo durante os períodos de menor movimento, além das taxas de juros elevadas.

Os montantes pagos por clientes que haviam adquirido produtos da linha “Promo” seriam restituídos integralmente através de vouchers, corrigidos em 150% do CDI, podendo ser utilizados para a aquisição de outros produtos da própria empresa. Contudo, a empresa justificou que está temporariamente impedida, por lei, de realizar desembolsos enquanto o pedido de recuperação judicial é avaliado.

As ações judiciais movidas por clientes e credores em todo o país têm se acumulado, ultrapassando 1,3 mil apenas em Minas Gerais. A Secretaria Nacional do Consumidor considerou a interrupção dos vouchers pela 123 Milhas uma violação de contrato e planeja uma reunião com os proprietários da empresa e o Ministério Público para adotar providências que minimizem os prejuízos aos clientes.

Ocorre que, o deferimento do processamento da recuperação judicial engloba os acordos e outras relações legais firmadas pela 123 Milhas que passam a desfrutar de uma salvaguarda legal (Stay Period) contra procedimentos de execução ou qualquer outro ato que possa constranger seus ativos (ex. penhora) por um intervalo mínimo de 180 dias, com a possibilidade de extensão por igual prazo.

Em outras palavras, é possível afirmar, na prática, que os credores terão que permanecer em um estado de “espera” pelo prazo mínimo de um ano, sem a capacidade de reivindicar seus créditos de forma total ou efetiva (exceto, evidentemente, em casos de circunstâncias novas que alterem drasticamente a trajetória do processo, como o não cumprimento de alguma disposição da Lei de Recuperação Judicial que resulte na conversão do procedimento em Falência).

Desse modo, os créditos vencidos ou a vencer até a data do pedido de RJ estão sujeitos às condições futuramente impostas pelo plano de recuperação judicial (descontos, parcelamentos, prazos de carências, etc), salvo as exceções legais, à exemplo das travas bancárias e dos negócios jurídicos fiduciários.

Por outro lado, os créditos que forem originados após o pedido da RJ não estão sujeitos à recuperação judicial e deverão ser pagos “normalmente”, sendo necessário alertar que se estará tratando de uma devedora com a capacidade de pagamento, em tese.

A empresa afirma que não irá suspender suas atividades, mas de fato todos os consumidores e credores da empresa passarão a depender da decisão do novo comitê, antes de receberem seus créditos, pois os detalhes da regularização dos pagamentos serão definidos em assembleia geral, por meio do plano de recuperação judicial.

Isso ocorre porque, na recuperação judicial existe uma ordem de pagamento, antes dos consumidores prejudicados – credores quirografários – há os créditos trabalhistas, os tributários e os definidos em garantia real. Além disso, só se avança para a categoria seguinte se a anterior estiver totalmente satisfeita.

De mais a mais, o código consumerista não deixa de ser aplicável às relações de consumo em que figurem empresas em Recuperação Judicial – o que sequer ainda é o caso da 123 milhas, pois a recuperação judicial ainda se encontra em fase inicial de processamento, não sendo concedida em definitivo, o que apenas ocorrerá após e se houver aprovação do referido plano de recuperação judicial, ainda a ser apresentado e homologado pelo juiz.

Neste contexto, a 123 Milhas busca enfrentar as dificuldades do mercado de viagens e traçar uma rota de reestruturação para superar os desafios financeiros atuais.

 

*Filipe Denki é secretário Adjunto da Comissão de Recuperação de Empresas e Falência do Conselho Federal da OAB, especialista em Direito e Processo Civil e Advocacia Empresarial e sócio do escritório Lara Martins Advogados

*Laura Finholdt Lopes é graduanda em Direito na Pontífice Universidade Católica de Goiás (PUC-GO), integrante do núcleo de Recuperação Judicial e Falência do Lara Martins Advogados e escritora de artigos na área de insolvência empresarial

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Entrevista. Filipe Denki. Valor Econômico. Ranking das maiores recuperações judiciais do Brasil https://laramartinsadvogados.com.br/noticias/entrevista-filipe-denki-valor-economico-ranking-das-maiores-recuperacoes-judiciais-do-brasil/ Thu, 19 Jan 2023 17:30:27 +0000 https://laramartinsadvogados.com.br/?p=7683 https://valor.globo.com/empresas/noticia/2023/01/18/recuperacao-judicial-da-americanas-deve-ser-a-4a-maior-da-historia-brasileira.ghtml

Entrevista concedida pelo advogado, sócio do Lara Martins Advogados, especialista em Direito Empresarial, Filipe Denki.

_Leia abaixo na íntegra.

 

Os escritórios de advocacia Lara Martins Advogados e Mingrone e Brandariz, especializado em recuperação judicial, informaram à Folha de S.Paulo o ranking das maiores operações dessa natureza no Brasil até hoje, com base na dívida das companhias quando entraram com o pedido.

De acordo com o levantamento, a Americanas deve ocupar o quarto lugar entre as maiores operações de recuperação judicial já realizadas no Brasil, considerando a dívida confessa da companhia de R$ 40 bilhões.

Antes dela estão Odebrecht (R$ 80 bilhões), Oi (R$ 65 bilhões) e Samarco (R$ 55 bilhões). Depois de Americanas, aparecem na lista Sete Brasil (R$ 19 bilhões) e OGX (R$ 12,3 bilhões).A recuperação judicial da Oi, concluída em 14 de dezembro do ano passado, é considerada a maior do país, com exceção da Odebrecht, que também arrastou para o mesmo ranking outras empresas denunciadas na operação Lava Jato da Polícia Federal (Sete Brasil e OGX).

Já a Samarco, controlada pela Vale e pela BHP Billiton, responsável pela maior tragédia ambiental do país, em novembro de 2015, com o rompimento da barragem de Bento Rodrigues (MG).

Nesta terça-feira (17), a Americanas anunciou a chegada de Camille Loyo Faria como diretora financeira e de relações com investidores da companhia, que deve iniciar seu mandato no próximo dia 1º de fevereiro. Camille é ex-diretora de finanças e de relações com investidores da TIM e ocupou o mesmo cargo na Oi entre novembro de 2019 a agosto de 2021, período em que a empresa estava em recuperação judicial.

Depois que o mercado foi pego de surpresa na semana passada, com o anúncio do ex-presidente da Americanas, Sergio Rial, de que havia encontrado “inconsistências” no montante de R$ 20 bilhões no balanço da companhia, a empresa surpreendeu mais uma vez ao indicar, dois dias depois, que suas dívidas chegavam a R$ 40 bilhões.

“Os necessários ajustes contábeis a serem oportunamente feitos pela Americanas para correção das inconsistências detectadas poderão implicar no descumprimento dos ‘covenants financeiros’ previstos em vários dos contratos celebrados com seus credores financeiros, inclusive estrangeiros, permitindo que declarem o vencimento antecipado e imediato de, aproximadamente, R$ 40 bilhões em dívida”, informou a companhia no pedido de tutela de urgência cautelar, deferido pela 4ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro no último dia 13.

O número corresponde à soma dos R$ 20 bilhões expostos pelo ex-presidente da Americanas e da dívida bruta da companhia, que em setembro de 2022, último dado disponível, era de quase R$ 20 bilhões. “Covenants financeiros” são obrigações aplicadas aos tomadores de crédito.

Obtenção de liminar em tempo recorde pode gerar interpretações 

Conforme a Folha de S.Paulo antecipou nesta terça (17), a empresa se prepara para entrar com um pedido de recuperação judicial nos próximos dias. A princípio, o valor seria de R$ 20 bilhões. Mas o valor pode mudar, uma vez que depende da negociação com os credores e da avaliação do juiz sobre o pedido de recuperação judicial.

“O pedido de recuperação judicial é feito com base no valor que a empresa inicialmente entende como sujeito à operação, com base no que chamamos de primeira lista de credores”, disse Filipe Denki, diretor da Comissão de Recuperação de Empresas e Falência do Conselho Federal da OAB e sócio do Lara Martins Advogados, responsável pelo levantamento. Denki trabalhou nas recuperações judiciais da Oi e da Samarco, defendendo os credores.

“Essa primeira lista pode sofrer alterações após a verificação de crédito feita pelo administrador judicial, que fica encarregado de divulgar a segunda lista de credores”, diz o especialista. “Ao final, o administrador judicial também faz uma última verificação para consolidar o quadro geral de credores”. Essa consolidação é importante, explica, para dar início ao pagamento das dívidas.

Mas os credores podem entrar com recurso por muito tempo contra a Americanas, a julgar pelo processo da Oi, um dos mais longos da história, com duração de seis anos (2016 a 2022). “Mesmo após o encerramento da recuperação judicial da Oi, há ações de impugnação de crédito em julgamento na Justiça”, afirma Denki.

O especialista ressalta que a recuperação judicial serve para a empresa continuar funcionando e honrar seus compromissos. “O que pode mudar é redução de ofertas e estoque”, diz ele, que não duvida que o caso vai render muitos desdobramentos judiciais –considerando também a atuação de auditorias da varejista, a PwC, que não identificou as “inconsistências contábeis”.

“A própria obtenção de liminar em tempo recorde, obtida em um primeiro momento em segredo de Justiça, num caso com tantos envolvidos, dá margem a várias interpretações.”

No radar, demissão, fechamento de lojas e vedas de ativos

Na opinião de André Pimentel, sócio da Performa Partners, a liminar obtida pela empresa –que protege a Americanas de qualquer cobrança pelo período de 30 dias– já tem todas as características de uma recuperação judicial. “Caso a recuperação judicial venha a ser solicitada pela empresa, esse prazo já estaria contando dentro do processo”, afirma.

“A companhia poderá continuar pagando fornecedores, por exemplo, e não pagar bancos. Na recuperação judicial, todos os créditos anteriores ao pedido estariam suspensos”, diz.

De acordo com o consultor –que trabalhou na reestruturação da Americanas no fim dos anos 1990, quando estava na Galeazzi & Associados e, antes disso, atuou na PwC, atual auditoria da Americanas–, a companhia já começou a ser impactada como se tivesse pedido uma recuperação judicial.

“Tenho relatos de fornecedores que estão segurando novos fornecimentos, e certamente os bancos já suspenderam as operações de adiantamento de fornecedores, que são fundamentais para a manutenção do negócio de pequenas e médias empresas”, diz ele.

Para Pimentel, com a recuperação judicial deve vir a redução da operação no curto prazo, com fechamento de lojas físicas, centros de distribuição e demissões.

“Outro impacto deverá ser a provável colocação de ativos do grupo à venda como forma de obter capital, como o Hortifruti e a Uni.co, que são operações que ainda mantêm elevada independência”, diz. Na opinião do consultor, a parceria entre Americanas e a Vibra, na exploração de lojas de pequeno varejo, dentro e fora de postos de combustível, através das redes de lojas Local e BR Mania, também deve entrar no radar do mercado.

“O processo de recuperação judicial não é barato, a companhia vai ter inúmeras despesas com isso –advogados, administrador judicial, assessores financeiros, operacionais, documentação etc.”, afirma o consultor, lembrando ainda que a Americanas deve enfrentar um monte de ações na justiça, com pedidos de reparação de prejuízos.

“O fato de a relação da companhia com os bancos ter se deteriorado é uma verdadeira catástrofe, porque mais do que nunca ela vai precisar de crédito”, diz. “A Americanas tem grandes chances de sair infinitamente menor do que entrou.”

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A necessidade de apresentação de CND para obtenção da extinção das obrigações do falido https://laramartinsadvogados.com.br/artigos/a-necessidade-de-apresentacao-de-cnd-para-obtencao-da-extincao-das-obrigacoes-do-falido/ Mon, 14 Nov 2022 19:24:31 +0000 https://laramartinsadvogados.com.br/?p=7661 Por Filipe Denki e Jorge Lucas de Oliveira*

 

A legislação falimentar brasileira constitui ferramenta jurídica vital para o regular funcionamento da economia nacional em momentos como o atual, de crise e aprofundamento dos gargalos industriais, especialmente (I) o financiamento, que obriga o empresário brasileiro suportar a 3ª maior taxa de juros do mundo[1] e (II) o extenso retardo tecnológico, que nutre nossa dependência da produção (intelectual, inclusive) internacional de manufaturados.

Para amenizar, portanto, tais assimetrias competitivas, que ciclicamente desaguam em crises sistêmicas, temos em nosso arcabouço jurídico os institutos da Recuperação Judicial e da Falência. Esta para empresas que não mais possuem viabilidade econômica e devem ser encerradas, aquela para as situações em que se verifica uma crise de caráter reversível/conjuntural na atividade empresarial.

No presente artigo, destacar-se-á o caso da falência, para melhor compreendermos a pertinência (ou não) da exigência de regularidade fiscal (apresentação de CND) como condição para o encerramento das obrigações falimentares.

Vejamos.

Do longínquo ano de 1945, sob a regulação pelo Decreto nº 7.661, até dezembro de 2020, quando a Lei nº 11.101/2005 (LFRJ) sofreu modificações substanciais, o Norte que guiava os processos de falência era otimizar a utilização produtiva dos bens, ativos e recursos produtivos da empresa, visando solver o máximo possível das dívidas suportadas pela massa falida. Melhor dizendo, o foco era concentrado no pagamento do maior número de credores.

Nada mais coerente e justo, dentro de uma lógica de execução coletiva onde há preferências legais e uma ordem de pagamento das dívidas, afinal a lei deve reprimir e não institucionalizar calotes.

Ocorre que, com o passar do tempo, o surgimento de novas tecnologias e o advento da economia do conhecimento, a prática do empreendedorismo foi impulsionada vertiginosamente, e a figura do empresário se transformou numa peça essencial e irremovível das economias nacionais.

Colhe-se os exemplos das startups, mentorias individuais e outra série de modalidades que denotam o crescimento do setor de serviços ao redor do mundo.

Nesse sentido, embora o Brasil se encontre há pelo menos 30 anos, sob processo de desindustrialização[2], caminhando na contramão da conjuntura apresentada no parágrafo anterior, é possível inferir que a “nova” Lei de Falências trouxe um fio de esperança no que diz respeito à valorização do empreendedorismo como força vital para o giro da roda da economia.

Vejamos, nos destaques em negrito os dispositivos acrescidos na legislação:

Art. 75. A falência, ao promover o afastamento do devedor de suas atividades, visa a:

(…)

II – permitir a liquidação célere das empresas inviáveis, com vistas à realocação eficiente de recursos na economia; e

III – fomentar o empreendedorismo, inclusive por meio da viabilização do retorno célere do empreendedor falido à atividade econômica.

(…)

A falência é mecanismo de preservação de benefícios econômicos e sociais decorrentes da atividade empresarial, por meio da liquidação imediata do devedor e da rápida realocação útil de ativos na economia.

Inegável, a nosso juízo, o acerto do legislador e o consequente aprimoramento do texto legal, alinhando-o com os valores da modernidade e da liberdade econômica, passando uma mensagem clara de que o processo falimentar se relaciona não só com o final/encerramento da atividade empresarial, mas, principalmente, com o seu recomeço célere.

Pois bem, levando em conta o contexto apresentado, adentremos de forma objetiva ao cerne da questão: seria razoável exigir a apresentação de Certidão Negativa de Débitos (tributários) para que o empresário falido obtenha a “quitação” de suas obrigações falimentares e possa retornar ao mercado?

Em tese, não haveria de se vislumbrar nenhuma irrazoabilidade na exigência. Afinal, não se pode contemporizar com a mentalidade de certos empresários que “se financiam” no não pagamento de tributos, ou que veem na prática da sonegação uma espécie de “legítima defesa” contra o estado.

Por outro lado, todavia, não se pode olvidar que a legislação tributária brasileira constitui verdadeiro caos normativo extremamente penoso de ser seguido por quem quer seja. Nesse sentido, é inafastável a constatação de que o passivo fiscal é, não raras as vezes, insolúvel quando da ocasião da quebra de uma empresa. Tanto o é que, as dívidas de empresas falidas são classificadas pela própria Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional como irrecuperáveis[3].

Ademais, o art. 114-A da LFRJ (outra novidade da lei) nos remete à inteligência de que, o encerramento da falência não depende do pagamento de todos os credores, mas sim, da realização de todo o ativo (que certamente não será suficiente para arcar com todas as dívidas).

Pergunta-se, portanto, o que fazer com uma empresa cuja massa falida não tem numerário suficiente para regularizar seu passivo fiscal? Negar-lhe a volta do empresário às atividades empresariais?

Não se pode perder de vista que o próprio estado de insolvência pressupõe a incapacidade de adimplemento da totalidade das dívidas contraídas.

Dessa forma, embora toda a estrutura normativa confira uma série de garantias (justas) ao crédito público, na prática muitas das massas falidas não terão condições de suportá-lo. E salvo hipóteses de fraudes e/ou crimes falimentares (que comportam uma discussão na esfera penal), não se pode responsabilizar a pessoa física pelo inadimplemento da pessoa jurídica, e, em última instância, negar a “ressocialização” do empresário pelo mesmo motivo.

O Superior Tribunal de Justiça (STJ), quando instado a resolver a celeuma em comento, expressou o entendimento de que a extinção das obrigações poderia se dar tanto em “maior” quanto em “menor” abrangência[4]. Na primeira hipótese quando fossem satisfeitos apenas os requisitos da Lei falimentar (sem a prova da quitação dos tributos), na segunda, quando houvesse tanto a regularidade perante o fisco quanto em relação aos dispositivos da Lei nº 11.101/05.

Na prática, o Tribunal encontrou um paliativo no sentido de que, o falido poderá obter a extinção de suas obrigações, exceto em relação ao fisco, que poderá “continuar demandando” contra a falida – o que não se vislumbra na prática.

É certo, logo, que a inscrição na dívida ativa não poderia ser simplesmente cancelada, mormente porque o encerramento da falência não consta como fator de extinção do crédito tributário. Ocorre, todavia, que com a baixa da falida no CNPJ, as execuções fiscais em curso terão que ser extintas por falta de pressupostos de constituição e desenvolvimento válido e regular do processo (uma das partes não mais existe).

Ou seja, a dívida continuará a existir (apenas por existir), de modo que só será extinta em definitivo quando atingida pela prescrição.

Nota-se, ao teor do exposto, que a exigência de regularidade fiscal para a extinção das obrigações falido deve ser encarada com enfoque mais pragmático/utilitário, de forma que a norma jurídica tributária possa ser atualizada e definitivamente harmonizada com o sistema falimentar, à exemplo da inserção do art. 7º-A, na Lei nº 11.101/05, que instituiu o incidente de classificação do crédito público no processo de falência, sanando outro grande problema até então enfrentado pelo fisco, qual seja, do procedimento correto a ser adotado para inclusão do crédito público na falência.

 

*Jorge Lucas de Oliveira

Advogado e Administrador Judicial membro do Núcleo de Recuperação de Empresas do Lara Martins Advogados. Ex-integrante do Núcleo de Falência e Recuperação Judicial da Procuradoria da Fazenda Nacional em Goiás (PFN/GO).

[1] https://valorinveste.globo.com/mercados/moedas-e-juros/noticia/2022/06/15/com-selic-a-1325percent-brasil-tem-a-3a-maior-taxa-de-juro-nominal-do-mundo.ghtml

[2] https://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=37591

[3] Portaria PGFN nº 6757/2022, art. 25, III, “a”.

[4] https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias-antigas/2015/2015-09-24_08-02_Quarta-Turma-admite-extincao-das-obrigacoes-de-falido-sem-prova-de-quitacao-de-tributos.aspx

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A falência como mecanismo de reestruturação empresarial https://laramartinsadvogados.com.br/artigos/a-falencia-como-mecanismo-de-reestruturacao-empresarial/ Mon, 04 Jul 2022 19:55:05 +0000 https://laramartinsadvogados.com.br/?p=7477 Por Filipe Denki.

 

A falência é um processo de execução coletiva em que todos os bens do falido são arrecadados para uma venda judicial forçada, com a distribuição proporcional do ativo entre os credores, estando regulamentada em nosso ordenamento jurídico através da Lei nº 11.101/05 (Lei de Falência e Recuperação de Empresas).

Quando uma empresa se torna inviável e não tem condições de arcar com suas obrigações, a falência ou autofalência é a forma regular de encerramento da atividade empresarial. Através desse procedimento, o falido poderá obter a extinção de suas obrigações.

É muito comum vermos situações em que os empresários endividados simplesmente abandonam seus “CNPJ’s” abandonando suas dívidas (empréstimos, tributos, fornecedores e funcionários), o que caracteriza encerramento ou dissolução irregular de suas atividades, e procuram voltar a exercer atividade empresarial através de terceiros, conhecidos como “laranjas”.

A dissolução irregular de sociedade é caracterizada pela inoperância das atividades da empresa sem que ocorra a sua baixa na junta comercial e outras repartições competentes, ou seja, a dissolução irregular da sociedade comercial é o abandono da empresa sem que ocorra o seu correto encerramento. Também se presume dissolvida irregularmente a empresa que muda de endereço sem comunicar a administração pública (Súmula 435 do STJ).

A dissolução irregular da sociedade comercial caracteriza responsabilidade subjetiva e, portanto, acarreta a responsabilidade pessoal dos sócios por todas as dívidas tributárias da empresa, ou seja, o fisco perseguirá os bens pessoais dos sócios para sanar eventual crédito tributário existente.

Recentemente, ministros da 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiram que o sócio com poderes de administração no momento do fechamento irregular de uma empresa deve responder pelos débitos fiscais, mesmo que não tenha exercido a gerência no momento do fato gerador do tributo não pago (REsps 1643944/SP, 1645281/SP e 1645333/SP).

Muitos empresários justificavam o abandono de suas empresas, ou seja, o encerramento irregular das atividades, em razão da ineficiência que era o instituto da falência. Não raras as vezes, tornavam-se processos intermináveis, dotados de grande contencioso sem qualquer resultado prático, uma vez que os requisitos para seu encerramento e a extinção das obrigações do falido eram demasiadamente demorados.

Dessa forma, para muitos empresários era mais prático abandonar suas empresas e correr o risco de ter seu patrimônio pessoal responsabilizado pelo pagamento de dívidas da empresa, em especial as tributárias, e voltar a exercer atividade empresarial em nome de terceiros, do que dissolver regularmente através de um processo de autofalência.

Com a recente reforma da lei, com advento da Lei nº 14.112/20, o instituto da falência sofreu mudanças significativas e para melhor, o que possibilitará ao empresário ou à sociedade empresária que se tornou inviável encerrar regularmente suas atividades e retornar rapidamente ao exercício empresarial.

Com a reforma da lei, foram inseridas alterações para tornar mais célere a extinção das obrigações do falido e permitir o fresh start, que ocorrerá nas seguintes hipóteses:

  • Pagamento de mais de 25% dos créditos quirografários (art. 158, II);
  • Decurso de prazo de três anos, contados da decretação da falência (art. 158, V);
  • Encerramento sumário da falência em caso de ausência de bens do falido (art. 114-A).

fresh start, inspirado no direito falimentar americano, pela qual, sob certas condições, o falido fica exonerado de suas obrigações anteriores para que retorne novamente à economia ativa, é um importante instrumento para permitir o célere retorno do empresário falido ao mercado.

A prática da empresa cumpre inquestionável função social, pois, através dela, se produz receita para o Estado (tributos) e para o particular (empreendedores, trabalhadores, fornecedores e consumidores) através da geração de empregos e circulação de riqueza por meio da comercialização de bens e serviços.

Dessa forma, a autofalência revela-se como ferramenta hábil de reestruturação empresarial na medida em que tornou mais célere a extinção das obrigações do falido, possibilitando o retorno célere do empreendedor falido à atividade econômica, além de afastar a ilegalidade no encerramento da sociedade empresária e suas consequências.

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Grandes Empresas Recorrem à Recuperação Judicial em meio à pandemia. https://laramartinsadvogados.com.br/artigos/grandes-empresas-recorrem-a-recuperacao-judicial-em-meio-a-pandemia/ Mon, 08 Nov 2021 14:56:30 +0000 https://laramartinsadvogados.com.br/?p=7227 Por Filipe Denki 

 

Muitas empresas brasileiras, durante a pandemia da Covid-19, tiveram de recorrer a uma medida extrema para evitar a falência, que é pedir recuperação judicial. A medida nada mais é do que um respiro que a legislação brasileira permite a uma companhia para tentar se reerguer, renegociando suas dívidas e, às vezes, até desenhando um novo plano de negócio.

O número de pedidos de recuperação judicial aumentou 50% em agosto deste ano ao chegar aos 111 contra os 74 do mês anterior, em setembro foram 56 pedidos. De acordo com o Indicador de Falências e Recuperação Judicial da Serasa Experian, o mês de agosto foi o que registrou o maior número de pedidos desde o começo de 2021. A maior parte das requisições partiram do segmento do comércio (43,2%).

Do total de 696 pedidos de recuperação judicial até o mês de setembro, 476 pedidos foram de micro e pequenas empresas, 146 de médias empresas e 74 de grandes empresas.

Em que pese, as grandes empresas terem em regra caixa e uma estrutura mais organizada para aguentar crises prolongadas, em 2021 diante da grave crise econômica que o país vive, atingindo todos os setores da economia, muitas estão recorrendo a recuperação judicial para renegociar suas dívidas.

É o caso da LATAM com dívidas superiores a R$ 7 bilhões, que pediu recuperação judicial nos Estados Unidos, da Supervia, companhia de trens urbanos do Rio de Janeiro com dívidas em torno de R$ 1,2 bilhões. O Grupo Metodista de Educação possui dívidas que ultrapassam a casa dos R$ 500 milhões.

Também temos o caso de famosas redes varejistas que pediram recuperação judicial como é o caso da TNG, que tem mais de 180 lojas e dívida estimada de R$ 65 milhões, a Le Postiche, com 140 lojas e dívida de R$ 140 milhões, e a Cavalera, com 11 lojas e dívida de R$ 11 milhões.

Porém, nenhuma delas chamou mais a atenção do que o caso da mineradora Samarco, joint-venture da Vale e da BHP Billiton. Com o processo em curso, a empresa tenta renegociar a sua dívida total, que já ultrapassa R$ 50 bilhões em passivos, manter as operações que foram retomadas no fim de 2020 e suspender temporariamente as ações dos mais de 2 mil credores que enfrenta dentro e fora do Brasil.

A recuperação judicial da Samarco tornou-se a 3ª maior da história do país através da empresa Oi S/A com dívida superior a R$ 65,4 bilhões, 2ª colocada, e o da Odebrecht a maior do país com passivo superior a R$ 84 bilhões.

A recuperação judicial é uma medida jurídica legal onde a empresa em dificuldade financeira consegue um prazo para continuar operando enquanto negocia com seus credores, sob mediação da Justiça. As dívidas ficam congeladas por 180 dias, podendo ser prorrogada por igual período. Durante a recuperação judicial a empresa (devedor) apresentará um plano de recuperação judicial visando renegociar suas dívidas, esse plano poderá prever novas condições de pagamento como desconto, carência e parcelamento, entre diversas outras medidas.

No início do ano, havia uma expectativa do aumento de pedidos de recuperação judicial. Empresas especializadas no assunto apontavam o número de pedidos de recuperação judicial que pode chegar a 1,8 mil em 2021, uma alta de 53% em relação ao ano passado.

O número de casos, se confirmado, será semelhante aos observados na crise de 2015 e 2016, ano com o maior número de pedidos da história, quando uma das mais agudas crises econômicas levou grande número de empresas a pedir proteção judicial para negociar com seus credores.

O que não se sabe ao certo é o motivo pelo qual ainda não houve um aumento nos pedidos de recuperação judicial esperado, já que a grave crise econômica que estamos vivendo resultou no fechamento de mais de 1 milhão de empresas ano passado, retração do PIB em 4,1% em 2020 como uma leve expectativa de melhora esse ano e um número recorde de desempregados que ultrapassam os 15 milhões de pessoas.

O que temos certeza é que, tanto as grandes e médias empresas estão suscetíveis de passar por dificuldades financeiras, sendo necessário a utilização de ferramentas de reestruturação empresarial como é o caso da recuperação judicial, e os números nos mostram isso.

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JORNAL ESTADÃO. Artigo Filipe Denki. PLP nº 33: uma saída para as micro e pequenas empresas em crise. https://laramartinsadvogados.com.br/noticias/jornal-estadao-artigo-filipe-denki-plp-no-33-uma-saida-para-as-micro-e-pequenas-empresas-em-crise/ Wed, 12 May 2021 15:46:45 +0000 https://www.laramartinsadvogados.com.br/?p=3963 Artigo publicado pelo Jornal “Estadão” de autoria do Advogado, sócio do Lara Martins Advogados e gestor do Núcleo de Recuperação de Empresas, Filipe Denki, abordando aspectos do PLP nº 33: uma saída para as micro e pequenas empresas em crise.

 

PLP nº 33: uma saída para as micro e pequenas empresas em crise.

É indiscutível a importância das micro empresas e pequenas empresas (MEP’S) para o país, segundo pesquisa do Sebrae as MEP’s representam 98,5% das empresas privadas, são responsáveis por 27% do PIB e 54% dos trabalhos formais.

Em que pese corresponderem a quase 99% das empresas privadas no Brasil, os empresários individuais, pequenos e micro raramente fazem uso da recuperação judicial.

Segundo Associação Brasileira de Jurimetria – ABJ, entre 2010 a 2017 apenas 20,4% dos pedidos de recuperação judicial eram de MEP’s, nesse período em São Paulo, Estado com o maior número de pedido de recuperação judicial no país, apenas 07 (total 906) pediram RJ pelo plano especial.

Os principais obstáculos para o acesso do micro e pequeno empresário ao regime recuperação judicial estão a complexidade de processo, altos custos, morosidade do processo e ineficiência.

A Lei de Falência e Recuperação de Empresas (Lei nº 11.101/05) prevê um tratamento diferenciado às micro e pequenas empresas, podendo optar pela recuperação judicial pelo plano especial.

A microempresa ou empresa de pequeno porte que optar pelo plano especial, o que será feito de forma expressa na petição inicial, deverá se submeter aos regramentos específicos previstos entre os arts. 70 e 72 da lei 11.101/05.

A recuperação judicial pelo plano especial traz alguns benefícios, aqui destaco, a apresentação de contabilidade simplificada, limitação dos honorários do administrador judicial e a não exigência de formação de assembleia geral dos credores para sua aprovação.

Por outro lado, as MEP’s que optarem pelo plano especial, deverão iniciar o pagamento dos créditos sujeitos à recuperação judicial no prazo máximo de 180 (cento e oitenta) dias, contado da distribuição do pedido de recuperação judicial, enquanto a recuperação judicial ordinária poderá ser paga com carência bem maior e o parcelamento da dívida será de apenas 36 (trinta e seis) vezes, enquanto a recuperação ordinária será conforme o plano de recuperação judicial, que na grande maioria das vezes prevê parcelamento infinitamente maior.

Em que pese o legislador ter pensado na recuperação judicial especial com a finalidade de facilitar o soerguimento das microempresas e empresas de pequeno porte, os números nos mostram que precisamos melhorar a recuperação judicial para as MEP’s.

Antes mesmo da grave crise econômica causada pelo coronavírus, já era de salutar importância pensarmos em melhorar nossa legislação em relação ao regime de insolvência para o micro e pequeno empresário, com a pandemia, esse tema ganhou ainda mais relevância.

De acordo com pesquisa divulgada pelo Sebrae, 1,044 milhão de empresas fecharam as portas no Brasil em 2020, desse número a grande maioria refere-se a micro e pequenas empresas. Os dados também informam que mais de 15 milhões de pessoas ficaram desempregadas em razão da pandemia do coronavírus.

Foi apresentado em março do ano no Senado, Projeto de Lei Complementar nº 33/2020 que institui o marco legal do reempreendedorismo, que estabelece a renegociação especial extrajudicial, a renegociação especial judicial e a liquidação especial sumária, bem como altera a falência das microempresas e empresas de pequeno porte. O  projeto foi aprovado por quase maioria absoluta dos Senadores (teve uma abstenção) em 08/12/2020.

 

O projeto prevê a criação de estímulos para que o empreendedor (MEP’S) adote medidas logo no início da constatação de situação de crise, através da criação de procedimentos simplificados de renegociação, extrajudicial e judicial e a liquidação especial sumária.

A finalidade deste Projeto é a busca por tornar o chamado reempreendedorismo uma opção menos onerosa, mais ágil e operativa para as MPE. Para a criação de um ambiente que possibilite a recuperação da MPE, o novo sistema sugerido no Projeto prevê alterações na LC 123/06.

Em relação à renegociação especial extrajudicial o devedor e seus credores poderão negociar livremente plano de renegociação especial extrajudicial, excetuando os créditos fiscais e os previstos nos § 3º e 4º do art. 49 da Lei nº 11.101/05 (alienação fiduciária, leasing, adiantamento contrato de câmbio, etc).

O plano de recuperação extrajudicial deverá contar com a adesão de mais da metade dos credores independentemente do valor de seu crédito; e mais da metade do valor total dos créditos de cada uma das classes de credores.

A renegociação deve ser arquivada na Junta Comercial, não competindo a ela realizar a análise da legalidade do plano nem a verificação dos créditos.

Já no caso da negociação judicial, a empresa não precisaria ter dois anos mais apenas 01 ano de funcionamento para entrar com o pedido, como ocorre atualmente e a documentação exigida seria mais simples. Somente a apresentação de comprovante do enquadramento como microempresa, empresa de pequeno porte ou pessoa a elas equiparada e lista de ativos e relação de credores a ela submetida.

Por sua vez na liquidação especial permite ao empresário em situação de crise encerrar o seu negócio o mais rápido possível. Ele entregaria o patrimônio da empresa e os seus bens pessoais (exceto os de família) a um liquidante, que providenciará sua venda, o pagamento dos credores possíveis e arquivar as contas finais com o resultado da liquidação e dos rateios perante a Junta Comercial.

Por fim quanto a falência do micro e pequeno empresário, este após o decurso do prazo de 1 (um) ano contado da decretação da falência extingue as obrigações do devedor falido, podendo voltar imediatamente ao mercado, com o nome limpo, sem carregar as dívidas do antigo negócio (fresh start).

Destaco que o PLP nº 33/2020 está tramitando na Câmara dos Deputados em regime de urgência desde março desse ano e foi designado como relator o Deputado Hugo Leal (PSD-RJ), grande conhecedor da matéria e que teve grande contribuição na tramitação dos projetos de lei que culminou na Lei nº 14.112/20 (reforma da lei de falência e recuperação de empresas).

 

*Filipe Denki. advogado especialista em reestruturação empresarial. Presidente da Comissão Especial de Recuperação de Empresas e Falência da OAB/GO. Membro da Comissão Especial de Falência e Recuperação Judicial do Conselho Federal da OAB. Sócio do Lara Martins Advogados

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